Quem quer emprego ruim?

Artigo escrito pelo cineasta Marcolino Joe

Por Marcolino Joe [*]

Dizer que “ninguém quer trabalhar” virou o álibi preferido de quem oferece salário ruim e quer gratidão em troca. Em Sergipe, os dados mostram o contrário: o desemprego caiu, mas a subutilização da mão de obra segue alta. Ou seja, tem muita gente querendo trabalhar, mas sendo empurrada para o bico, para a informalidade, para o que der.

A informalidade atinge quase 40% dos trabalhadores no Brasil e mais de 55% nos estados mais pobres. São motoristas de app, entregadores, vendedores informais. Gente que trabalha muito, sem direitos e por pouco. Como define Ricardo Antunes, vivemos a “uberização do trabalho”: precarização com estética de liberdade.

A culpa, dizem, é da falta de qualificação. Mas o problema é estrutural: em Sergipe, quase 20% dos jovens de 15 a 17 anos estavam fora da escola em 2018. Programas como o Pé-de-Meia e os Centros de Excelência têm revertido esse cenário, mostrando que investir em educação funciona. Mas tem quem queira culpar o jovem. Isso é desonesto demais. Tentar transformar falhas coletivas em defeitos individuais é um truque ideológico, já ensinava Marilena Chaui.

E, claro, sobra veneno pro Bolsa Família. Mas em 2024, 75,5% das vagas formais no Brasil foram ocupadas por beneficiários do programa, provando que ele não desestimula o trabalho, pelo contrário. Ele permite que as pessoas sobrevivam enquanto buscam um emprego decente.

A verdade é simples: o Brasil não sofre de falta de mão de obra. Sofre de empregos ruins, baixos salários e patrões que preferem culpar o pobre do que rever o modelo.
Antes de apontar o dedo pro povo, talvez seja hora de rever a lógica.
Porque o problema não é quem não quer trabalhar. É quem ainda acha que o povo deve se conformar com pouco.

[*] É cineasta, estrategista e comunicador

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