Por Adir Machado [*]
Sou católico praticante (denominação que não gosto, mas que ajuda na compreensão). E, nessa condição, entendo que o legado de Francisco tem o peso interno de uma verdadeira “revolução”. Funciona como uma espécie de ideias renascentistas para a modernidade ou as ideias iluministas para a derrubada do Antigo Regime.
Não há como retroagir, a Igreja Católica não voltará a ser a mesma, ainda que os conservadores momentaneamente vençam. Rupturas, maiores ou menores, sempre provocam reações. Normal, especialmente se considerarmos a teoria dos sistemas. Basta verificarmos a Lava Jato e a posterior reação pró-corrupção ou pro-impunidade. Porém, a reconexão dos católicos com o mundo, do ponto de vista da cristandade, é uma marca de Francisco que não se apagará.
O catolicismo ficou mais humilde e mais próximo do Jesus que vive no pequeno, no diferente, no povo. E o Papa que reagir a isso certamente carregará consigo o peso de funcionar como um Luís XVI em cena de Revolução Francesa, uma espécie de peça de quebra-cabeça mal encaixada.
Correntes como a minha (Movimento dos Focolares) não são adeptas à um catolicismo “de libertação” (Gustavo Gutiérrez), mas estamos muito longe de sermos adeptos do tradicionalismo católico. Somos, os moderados, maioria entre os leigos. Tínhamos um Papa que dialogava melhor com com o laicato, assim como Paulo II. Ainda sofríamos na ponta, pois a maior energia que João Paulo e Francisco gastaram foi na reforma da própria estrutura da Igreja. Por isso, tanto apoio dos fiéis. Somos cientes da necessidade de reforma por dentro.
Acontece que a reforma não foi completada. Assim, uma escolha na contramão desse movimento funcionará simbolicamente como dizer para nós que o sacerdote voltará a celebrar a missa de costas para seu povo. Assim como na política, também há quem, na igreja, deturpe o que está escrito em Apocalipse 3:16 para defender o radicalismo (“os mornos eu vomitarei”). No entanto, nenhuma das doutrinas radicais, na política ou na economia, possuem raiz bíblica. Só há um radicalismo admitido: o radicalismo no AMOR.
[*] Advogado