Por Professor Chico [*]
Articulista que escreve às sextas-feiras
Dedico este singelo texto a todos os professores que tive e tenho em minha vida, sobretudo aos meus pais, o professor que me incentivou a persistir em escrever poesia, um professor de quem admiro o trabalho e questionou sobre se deveria limitar o uso de celulares e um amigo querido que a vida me deu, que recentemente usou o Instagram para sugerir que a leitura é um caminho essencial para melhorar a escrita.
Aponto sobretudo para a importância da leitura na vida de cada um de nós e na necessidade de recuperar sua relevância, bem como democratizar seu exercício e seu potencial. Pois bem, sou filho de um casal de professores, de química e de história. Meu pai trazia livros para eu ler de coleções infantojuvenis que encontrava, e minha mãe teve condições de comprar revistas e livros pelos quais eu me interessava na temática que escolhia. Além disso, eu devorei enciclopédias e coleções de história que minha mãe tinha em casa durante minha adolescência. Definitivamente, eu sou bem de humanas.
Quando eu tinha 11 anos, um professor de português recém chegado em minha escola viu que eu escrevia e pegou um manuscrito de um poema meu, digitou e me incentivou a me inscrever num concurso de poesias.
No final do ano passado, no podcast Legis Ativo, o professor Humberto Dantas chamou atenção em sua conversa sempre bem humorada com seus parceiros de semanário sobre a questão de ser necessário limitar o uso dos celulares apenas nas escolas levando em conta o uso excessivo e generalizado desses aparelhos ou se isso não seria uma tendência de mais proibições e da urgência de repensar nossa dependência desses aparelhos.
Há alguns dias um amigo Professor Doutor em Filosofia sugeriu como caminho incontornável para escrever melhor a leitura. Desde os textos mais simples aos mais difíceis.
Sim, enquanto cidadão branco, cis, hetero e que estudou do antigo maternal até o antigo terceiro ano do ensino médio em escola privada eu tive sim uma influência e um ambiente econômico e comportamental propício para gostar de ler. Mas e quantos dos meus alunos e seus pais não tem ou não tiveram isso e poderiam ter suas vidas mudadas pelo conhecimento e pelos estudos?
De vez em quando eu presenteio meus alunos com livros e revistas dentro dos interesses que tem e falo da importância da leitura em minha vida pessoal e profissional. Tenho alunos que gostam de política, filosofia e temas correlatos. Por exemplo, minha esposa é feminista e adora ler livros e artigos sobre essa temática.
A sexta edição do levantamento “Retratos da leitura no Brasil”, feita pelo instituto Pró Livro, divulgada em novembro de 2024 aponta que 53% dos entrevistados não leram nem mesmo parte de uma obra nos três meses anteriores à pesquisa. Foi a primeira vez que o levantamento concluiu que a maioria dos brasileiros não leeem livros.
Tal levantamento considera tanto a leitura de livros impressos quanto digitais além de não restringir qualquer gênero incluindo didáticos, bíblia e religiosos. Apenas 27% dos brasileiros leu um livro inteiro. A leitura motivada pelo gosto diminui conforme aumenta a faixa etária dos indivíduos. O levantamento traz ainda uma lista de autores e obras mais lidos. Além disso aponta que 85% aponta a casa como o lugar onde costuma ler e só 19% consideram a escola o lugar onde costuma ler além de o fato de a recomendação escolar ser apontada como pesando menos na motivação para a leitura.
Diante da recente medida federal de proibição do uso de celulares nas escolas e da provocação do professor Humberto Dantas sobre isso o que fica claro é a necessidade de união, Estados e municípios estruturam bibliotecas e incentivo a leitura.
Sempre questiono em sala de aula sobre quem e quantos já leu ou leram algum livro nos celulares. A maioria não leu. Independente de faixa etária é difícil concorrer por atenção com promoções, compras, jogos, música e vídeos nos smartphones e tablets e infelizmente muitos municípios e escolas não tem bibliotecas municipais e das unidades escolares estruturadas sequer com catalogação imagine com funcionários para atender a demanda de quem gostaria de ler.
O sábio mestre que citei acima e gravou um vídeo em seu Instagram, sugerindo a leitura como fundamental para a escrita dá a letra para o que é necessário. Assim como ele saiu de sua cidade no interior de Sergipe e conquistou sua cadeira de professor na UFS e seus títulos acadêmicos em universidades mundo afora, meus alunos, seus pais e os que virão também podem.
É claro que hoje o acesso à leitura é mais simples, compactado e ágil. Não precisamos consultar aquelas enciclopédias grandes como tijolos e pesadas como bigornas, achamos muitas coisas no Google, inclusive livros inteiros.
Mas como esperamos soluções para os problemas do Brasil e do mundo de nossos alunos para além das formulas de cursinho da redação do ENEM se eles não leem para a construção de argumentos?
Frequentemente eu encontro respostas de atividades que foram copiadas da internet sequer sem uma reflexão primária acerca da pertinência do encaixe daquelas orações em resposta a pergunta que foi feita. Sim, que se leia desde a bíblia até aquele site de fofoca de famosos, passando por aquela pagina amadora de noticias da sua cidade, até aquele portal de noticias daquela emissora grande.
Por fim e não menos importante, essa velocidade e facilidade de informações tem nos levado ao consumo, crença e disseminação de desinformação de maneira a intensificar o questionamento da ciência, do jornalismo e das instituições da nossa democracia, por exemplo.
Em tese, lendo mais estaremos mais munidos contra a desinformação e melhor preparados para exercer nossa cidadania plena e nossas atividades profissionais. Sem querer ser Policarpo nessa nossa dura e complexa realidade, espero que no futuro estejamos num Brasil em que tenhamos tantos livros quanto smartphones ou pelo menos tenhamos as condições para propiciar isso.
[*] Francisco Emanuel Silva Meneses Alves é cientista social, articulista, comunicador político @politica_facil_ (no Instagram), Membro da Rede Estadual de Educação e Idealizador do projeto “Politica Fácil” enquanto professor temporário de sociologia na rede estadual de Sergipe
Referências:
O Brasil que lê menos: pesquisa aponta perda de quase 7 milhões de leitores em 4 anos
Link: O Brasil que lê menos: pesquisa aponta perda de quase 7 milhões de leitores em 4 anos; veja raio X | Educação | G1