Que graça, o voo das garças no rio Poxim

Artigo escrito pelo doutor em Saúde e Meio Ambiente, Luiz Eduardo

Por Luiz Eduardo Oliveira [*]

É com tristeza que observo o voo das garças no rio Poxim. Ao transitar pela avenida Beira Mar, que beira o rio Sergipe, até a avenida Paulo Barreto de Menezes, é possível constatar que todo o rio está comprometido, está posto à margem de qualquer projeto de revitalização. Houve até a tentativa de cercamento da lagoa do Apicum.

Vivemos em uma capital, Aracaju, onde poderíamos usufruir, racionalmente, dos manques e dos rios que permeiam e envolvem nossa cidade, porém seguimos consumindo seus peixes e crustáceos
contaminados.

Comecei, há alguns anos, apreciando as garças que, cheias de graça, frequentam os nossos rios e manques e que, por aqui, realizam seus voos de decolagem e aterrissagem, além dos encontros amorosos. Um espetáculo carregado de frenesi.

Entretanto, pude perceber, facilmente, que nossos rios estão poluídos e servem como propagação para várias doenças, grande parte por causa de microorganismos oriundos de águas poluídas com fezes e urina humana e de animais. Fato esse que representa um alerta para a saúde coletiva.

Por conta do trabalho, percorrendo, todos os dias, as ruas de Ará, parei nos bairros São Conrado e Orlando Dantas, que são atravessados pelo rio Poxim, e senti que o nosso pequeno rio vive uma angústia sem fim. Extremamente contaminado por conta dos efluentes urbanos, industriais e por ações da população que vive nas proximidades. Além do excremento humano (devido a quantidade de esgotos que são lançados diretamente), esses efluentes contêm grande número de produtos químicos e poluentes tóxicos, que são originários das atividades domésticas e comerciais, comprometendo a saúde humana. É do conhecimento comum que a avaliação e o monitoramento da água são fundamentais para a saúde de todos nós.

Em Aracaju, durante o processo de andanças, chamou-me atenção o rio Poxim. O vejo todos os dias ao transitar da Atalaia para o centro de Aracaju e vice-versa. Segui a margem do rio pelos bairros São Conrado, Orlando Dantas e Jabutiana e pude perceber o que está acontecendo por lá, um cenário de horror, de abandono.

Este importante rio, para nós, já foi objeto de investigações científicas, conforme pesquisa de Vasco et al, que estudaram a sub-bacia hidrográfica do rio Poxim, como parte da bacia do rio Sergipe, inserida na área metropolitana de Aracaju, e concluíram que o Poxim apresenta intenso processo de ocupação, em grande parte desordenada, trazendo intervenções que afetam o meio ambiente1.
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Sobre o rio Poxim, o IBGE2 aponta que o mesmo está inserido na região metropolitana da Grande Aracaju, que além da nossa capital ainda passa por São Cristóvão, Nossa Senhora do Socorro, Laranjeiras e Itaporanga D’Ajuda. Recebe as águas dos rios Poxim-Mirim, Poxim-Açu e Pitanga. As suas principais nascentes localizam-se a oeste, limite final da Serra dos Cajueiros e, sua foz, a leste, no complexo estuarino Sergipe/Maré do Apicum, próxima ao Oceano Atlântico.

Matos e outros pesquisadores3 chegaram à conclusão que 90 % das nascentes do rio Poxim apresenta significativa antropozição, com elevada degradação. Em 2020, foi entregue à visitação, o Parque Ecológico Poxim, localizado no bairro Inácio Barbosa, com 14 mil m² da área verde, porém sem acesso ao
rio e sem qualquer sinal de revitalização desse importante rio, que poderia ser usado para o turismo e para o transporte de passageiros, diminuindo o trânsito de veículos de transporte coletivo para o centro da cidade. Nada de novo ou impossível.

Como aracajuano e vendo a trajetória do rio, enquanto passa por nossa capital, pude observar o seu trajeto pelos bairros Coroa do Meio (Maré do Apicum – outra possibilidade para o transporte público), Farolândia, Inácio Barbosa, São Conrado, Jabutiana, contorno da Universidade Federal, e constatar a falta de planejamento urbano, bem como a presença de efluentes domésticos e industriais em suas águas, sem o devido tratamento.

Estamos destruindo as poucas reservas de águas em nossa capital, contribuindo para o aumento de doenças e deixando a cidade feia e com aspecto de “esgoto a céu aberto”. Não podemos esconder o Poxim, como foi feito na Farolância com seus córregos.

Imediatamente veio à memória o plano diretor de nossa capital, uma exigência do Estatuto da Cidade, uma lei federal (n. 10.257/2001), que traz instrumentos de controle do uso e ocupação e pude verificar que há construções simples e edifícios construídos por várias construtoras, às margens do rio Poxim. O último plano diretor de Aracaju foi promulgado em 2000 e um questionamento, entre tantos, surgiu: a quem interessa esse atraso?

Vamos pensar, antes que seja mais tarde, o planejamento urbano. Saúde e meio ambiente representam uma parceria que não comporta políticas apartadas.

[*] Doutor em Saúde e Ambiente

1 Fonte: VASCO, A. N.; BRITTO, F. B.; PEREIRA, A. P. S.; MÉLLO JÚNIOR, A. V. M.; GARCIA, C. A. B.; NOGUEIRA, L. C. Avaliação espacial e temporal da qualidade da água na sub-bacia do rio Poxim, Sergipe, Brasil. Ambi-Agua, Taubaté, v. 6, n. 1, p. 118-130, 2011. (doi:10.4136/ambi-agua.178)

2 Fonte: https://biblioteca.ibge.gov.br/biblioteca-catalogo.html?id=441029&view=detalhes

3 Nascentes da sub-bacia hidrográfica do rio Poxim, estado de Sergipe: da degradação à restauração. Fonte: http://www.ifs.edu.br/images/EDIFS/ebooks/2014/Rio_Poxim.pdf

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